Papel, caneta e recordações
Dias atrás, precisei fazer umas
trocas de móveis e chegou o momento fatal: limpar as gavetas!
Algumas pessoas podem encarar
essa tarefa como terapêutica, chata, ou ainda, uma forma de
"organizar a vida interior"; enfim, psicologias à parte,
arregacei as mangas e fui à luta. E posso dizer que para mim foi um
gostoso mergulho no passado. Vasculhando caixas encontrei cartinhas
de uma amiga do ginásio, pude ver ali um pouco dos momentos que
passamos, nossas alegrias, paixões e até dúvidas e medos (imensos
quando se tem 13, 14 anos...). Bilhetinhos da grande melhor amiga de
adolescência e todas as nossas aventuras e paqueras. Cartões de
Natal e aniversário de amigos que não vejo há séculos, mas
que marcaram épocas deliciosas da minha vida e, que lendo, tudo
aquilo sei que também fui importante naquela fase de suas vidas.
Tanta nostalgia, tantas frases carinhosas e criativas me
transportaram a dias e a pessoas especiais (algumas delas até estão
nas minhas páginas das redes sociais); outras, se perderam nos
caminhos diversos e corridos que o tempo nos leva.
E todo esse clima, esse material
singelo e bonito; sim, porque havia bilhetinhos em papéis de cartas
com lindos desenhos, adesivos meigos, cartões supercriativos (seja
nas frases, ou nas ilustrações), tudo isso me levou a um
inevitável questionamento: quem ainda troca correspondências - digo
com papel e caneta - nos dias de hoje? Que adolescente terá uma
caixa lotada de recordações como essas que, com certeza sua
mãe e sua avó tiveram?
Vivemos hoje algo que considero
preocupante (para dizer o mínimo): a síndrome do eterno presente.
Não se percebe o passado - inclui-se nesse contexto a História - e
muito menos se pensa no futuro. Tudo é o hoje, o agora, o já.
Hedonismo constante para se aproveitar o dia de hoje. Atualmente, as
pessoas tem a possibilidade de registrar tudo, seja por máquinas
digitais ou por meio dos celulares e todo esse registro raramente
fica impresso, eternizado Tudo é fugaz, basta um clique e todos os
arquivos de fotos, vídeos e músicas vão para a lixeira. Cada vez
mais não há a memória, a necessidade de guardar momentos que
fiquem conosco para sempre. Lembro que certa vez os quase
90 alunos de uma turma, onde eu lecionava Comportamento do Consumidor
ficaram "congelados" pensativos quando disse a eles
que seus filhos não saberiam como era o rosto deles quando
jovens, pois tiravam um monte de fotos e, depois que o prazo de
validade dos álbuns das redes sociais se esgotava, descartavam tudo.
E é exatamente o que acontece hoje,
tudo é para ser consumido hoje e descartado logo em seguida, para se
consumir mais "novidades" e descartá-las em seguida. Ok,
não há nada de errado em vivermos bem o agora. Mas não podemos
jamais nos esquecermos que somos a somatória do ontem, com o hoje e
é essa somatória que nos fará caminhar (ou empacar) amanhã.
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